Contando quase dois anos desde o primeiro confinamento catalisado pelo contexto pandémico, encontramo-nos ainda a dar os primeiros passos em direção à normalidade a que outrora fomos habituados. Entre eles, o pano de fundo do isolamento social vai caindo aos poucos à medida que retomamos as nossas relações sociais e revemos as pessoas que nos são importantes, desde amigos a familiares.
Contudo, depois de longos meses de isolamento e com a realidade das relações à distância instalada, quer seja no trabalho, escola ou na vida pessoal, pode ser natural e até bastante comum sentirmos dificuldades na interação com outras pessoas.
Para além disso, podem igualmente surgir preocupações do tipo “será que quando voltar a estar com outras pessoas, vou saber o que dizer e como me comportar?”, “estava tão habituada(o) a fazer apresentações ou a ter reuniões on-line, como será agora que vou ter que falar em frente a um público?”. E, certamente também experienciou ansiedade relativamente a, por exemplo, como iniciar ou encerrar as interações sem um aperto de mão, um beijinho ou um abraço, ou quanto à possibilidade de ficar sem assunto. Acompanhando estes eventos, podem estar igualmente presentes sentimentos de exaustão e cansaço depois de longas interações sociais. Para os mais introvertidos, será um aumento da necessidade de estar sozinho depois de uma interação, para os mais extrovertidos será uma novidade para a qual poderão olhar com uma certa estranheza (“não sei o que se passa comigo, fico cansado quando estou com os meus amigos e são muitas as vezes que prefiro ficar em casa do que enfrentar horas de convívio social”).
Eis que surge um novo desafio nuclear: como reconstruir conexões sociais?
Felizmente, somos seres altamente sociais, e as competências necessárias para nos conectarmos com outros seres humanos são inatas e bastantes resistentes. Também é verdade que temos uma grande capacidade de resiliência e adaptação, mesmo a contextos adversos ou poucos ideais, o que significa que criámos o hábito de nos conectarmos com os outros através de janelinhas virtuais. Ao virarmos a página de volta à normalidade, é natural que a nossa primeira reação perante futuras interações sociais seja de medo, tanto pela possibilidade de transmissão do vírus como pelo nosso desempenho a comunicar frente a frente. A ansiedade em relação às interações sociais é um sentimento muito presente no contexto atual, inicialmente porque não sabíamos como lidar com isolamento social obrigatório, agora pela incerteza de como reconstruir as conexões sociais tão transformadas pelo uso de recursos digitais na manutenção de vínculos.
No geral, é importante prestarmos atenção a este desafio e para os sentimentos que o acompanham com normalidade. A ansiedade e o desassossego da mente que a acompanha, é um dos mecanismos de sobrevivência mais primitivos da bagagem do ser humano. Esta emoção, relatada unanimemente como “desagradável” surge como tentativa de adaptação e sobrevivência do estado físico e mental a ambientes hostis ou menos familiares. O corpo e a mente ficam em alerta para enfrentar qualquer tipo de ameaça ou perigo. Contudo, a ansiedade é um estado transitório e cumpre um propósito, tal como as outras emoções.
Neste sentido, grande parte do processo de readaptação social pode passar por praticarmos autocompaixão e respeitarmos o nosso próprio ritmo. E, não se esqueça de que, cada um de nós agora se sente, até certo ponto, socialmente desajeitado e a gradualidade deste processo vai facilitar a readaptação social que conhecíamos.
Não podemos deixar de mencionar que algumas pessoas que sentiam dificuldades sociais prévias ao contexto pandémico, quer seja pela existência de um traço mais marcado de introversão, timidez, ou pela presença de uma doença mental, como a Perturbação de Ansiedade Social (ou Fobia Social), podem estar a lidar com a exacerbação destas dificuldades, o que pode causar prejuízo nas várias áreas da vida e na saúde mental em geral. Se este for o seu caso ou sentir mais dificuldades em se conectar com os outros, não hesite em pedir ajuda a um profissional de saúde mental.
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