No Brasil, as tradições da virada do ano variam de acordo com a religião e a região. Mas independentemente desses dois fatores, para todos o ano novo acontece no pico do verão. Eu cresci no interior de São Paulo em uma família nem tanto religiosa. As minhas memórias do Réveillon são todas na praia: as contagens dos segundos para o novo acontecendo com os pés na areia, enquanto todos à volta se vestem de branco e aproveitam aqueles minutos de pura esperança pelo ano que já vem. Quando a meia-noite já passou, cumprimentamos todos à nossa volta (inclusive estranhos!) e assistimos ao show de fogos. Depois, é hora de pular as 7 ondas no mar para atrair sorte no ano que começou e deixar as más energias do ano passado para trás - um ritual religioso da Umbanda (religião brasileira) mas que para muitos já não carrega um símbolo religioso.
Por isso, quando penso em Réveillon, penso em mar, calor, biquini, picolé. É por isso também que depois que me mudei para a Holanda, sinto muito a falta do calor nesta época do ano. Mas uma vez aqui, tive que me adaptar. Talvez uma das partes mais difíceis de ser imigrante é deixar tradições que gostamos tanto para trás, e criar novas que se encaixem na nossa nova realidade. É necessário um olhar apreciativo à nossa volta que nem sempre é fácil de ter.
Na minha jornada holandesa, consegui apreciar as tradições de ano novo daqui. Mesmo naquele frio absurdo, todos saem para as ruas. A noite de ano novo é muito movimentada, criando aquele burbulhinho de expectativa para a virada. Em cidades menores (e alguns bairros de cidades grandes também), é comum as pessoas saírem para a rua para contarem os segundos da virada junto dos vizinhos, e alguns até oferecem oliebollen caseiros fresquinhos para todos!
Três dias antes da virada, a compra e venda de fogos de artifício é legalizado na Holanda. Para o pesadelo de alguns e encanto de outros, o dia 31 e 1 são preenchidos por barulhos de fogos durante todo o dia, junto de risadas e gritos de felicidade das crianças e adolescentes. Na noite do dia 31, se vê muitas famílias com filhos pequenos soltando biribinhas na rua.
E claro, como não adorar o Nieuwjaarsduik, também conhecido como mergulho do urso polar? Esse mergulho de ano novo na praia acontece todo o dia 1 de Janeiro (quando não havia COVID). O maior evento acontece em Scheveningen, onde centenas de pessoas corajosas se juntam para o grande mergulho em águas a temperaturas negativas.
Sendo assim, eu aceitei que minhas tradições do dia 31 de Dezembro não são possíveis por aqui, e criei meu novo ritual da virada: assistir ao show de fogos de artifício na Erasmusbrug em Rotterdam com meus amigos, vestindo camadas de casacos, com uma garrafa de prosecco na mochila e um saco de oliebollen para acompanhar. E quem sabe quando o COVID passar, eu não me animo para tentar o Nieuwjaarsduik em 2023?
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